domingo, novembro 19, 2006

Retiro Espiritual

Uma Árvore. Espelho vivo da condição humana. Ao germinar o céu aberto alimenta sonhos de eternidade. Crescemos. Crescemos em direcção a esse horizonte sem limites. Azul. Imenso. Depois a noite pinta-o de escuro. Um sorriso. Milhares de pontos cintilantes acendem-nos um sorriso. Para lá do espanto pálido da Lua ansiamos ainda poder tocar essas orbes. Ir mais além. Ramificações que se estendem para lá de nós. Infinito? Nesse momento o peso da terra torna-se insuportável. Poder voar. O peso da raiz debaixo da terra torna-se insuportável. Como se um apelo nos puxasse da pedra que nos sustenta.
Uma Casa. As pedras, as árvores, os sons que ecoam à passagem de um vento profundo, que sussurrando, nos conta o segredo dessas vozes de outrora, vozes que se faziam ouvir muito antes de nós. Aqui se encontra o retiro espiritual perfeito. Faz-nos despertar para os uivos primordiais de uma natureza que nos precede e ultrapassa, e que simultaneamente apenas vive no pequeno instante que cabe entre o precede e o ultrapassa, isto é, no momento em que nos trespassa. As pedras, o frio das pedras, as árvores, o cheiro das árvores, a casa, os sons, as cores, as linhas da casa, apenas respiram no momento em que as vemos. As folhas, os ramos, as gotas da chuva apenas dançam porque existimos. As linhas da casa ensinam uma verdade tão antiga como o tempo: Não há rupturas, apenas transfigurações.
E num instante tudo parece fazer sentido de novo, porque a eternidade não se encontra para lá das nuvens, mas do lado de cá. E é nestes pequenos momentos em que nos sentimos vitoriosos. Momentos em que sentimos que roubamos o fogo aos Deuses reclamando o espaço infinito para tamanho sentir.
Obrigado.

3 comentários:

Anónimo disse...

Os momentos em que a alma se encontra connosco. No fundo, um retiro do mundo, para o mundo. O que nos foge, escapa por entre os dedos, o que de tanto nosso se faz tão longínquo, repousa aí, nesse abrigo. Que seja. Um retiro para encontrar a alma ou um abrigo minado onde nos oferecemos em sacrifício...que seja...desde que lá se sinta a eternidade da ausência com que temos de conviver.

Azzrael disse...

Porque tudo existe quando paramos para olhar o tudo... O retiro que precisamos para voltarmos a ser, para nos reencaminhar de volta ao nosso trilho. A alma humana perde-se muitas vezes e estes momentos de reflexão fornecem muitas das respostas que não encontramos.
Que o teu "retiro" tenha sido maravilhoso como espero que seja o meu.

Paulo Vinhal disse...

Já leste o "Humus" do Raul Brandão? Não tenho a certeza se já te falei nesse livro. Se nunca leste... é obrigatório que o leias.