sexta-feira, abril 15, 2011

O dia pede-me altitude

O dia pede-me altitude.
E se subíssemos uma montanha e contássemos a alguém uma história.
Quero histórias para contar.
Mas chega de histórias de baratas,
esse bicho feio e sombrio,
que foge da luz como se fosse ácido
e se alimenta das migalhas dos outros.
Estou farto de pessoazinhas!

First breath after coma (Explosions in the Sky)

sábado, junho 09, 2007

Dilema do Determinismo - Waking Life

Ou a) As nossas acções estão causalmente determinadas, ou b) As nossa acções não estão causalmente determinadas.
Se a), então as nossas acções são causadas por acontecimentos anteriores e remotos, sobre os quais não temos qualquer tipo de responsabilidade.
Se b), então nenhum acontecimento anterior as causou e as nossas acções são acontecimentos aleatórios, sobre os quais também não temos qualquer responsabilidade. Será que nunca podemos ser responsabilizados por aquilo que fazemos?

sexta-feira, junho 01, 2007

Pertencer ao Tempo


«(...) todos os dias de uma vida sem lustro, o tempo carrega connosco. Mas um momento chega sempre, em que somos nós a ter de carregá-lo. Vivemos sobre o futuro: «amanhã», «mais tarde», «quando tivermos uma boa situação», «com a idade hás-de compreender». (...) Um dia vem, no entanto, e o homem constata ou diz que tem trinta anos. Afirma assim a sua juventude. Mas, ao mesmo tempo situa-se em relação ao tempo. Toma aí o seu lugar. Reconhece que está num certo momento de uma curva que confessa ter de percorrer. Pertence ao tempo, e reconhece nesse horror que o empolga o seu pior inimigo.»

Albert Camus, O Mito de Sísifo

sábado, novembro 25, 2006

Cidades Invisíveis

A cidade de Sofrónia compõe-se de duas meias cidades. Numa fica a grande montanha russa de íngremes bossas, o carrossel com a sua auréola de correntes, a roda das gaiolas giratórias, o poço da morte com os motociclistas de cabeça para baixo, a cúpula do circo com o cacho dos trapézios a pender no meio. A outra meia cidade é de pedra e mármore e cimento, com o banco, os opiários, os prédios, o matadouro, a escola e tudo o resto. Uma das meias cidades está fixa, a outra é provisória e quando acaba o tempo da sua estadia despregam-na, desmontam-na e levam-na dali para fora, para a enxertar nos terrenos vagos de outra meia cidade.
Assim, todos os anos chega o dia em que os operários destacam os frontões de mármore, deitam abaixo as paredes de pedra, os pilares de cimento, desmontam o ministério, o monumento, as docas, a refinaria de petróleo, o hospital, e carregam-nos em reboques de grandes camiões para seguirem de praça em praça o itinerário de todos os anos. Aqui fica a meia Sofrónia das barracas de tiro ao alvo e dos carrosséis, com o grito suspenso da naveta da montanha russa do avesso, e começa a contar quantos meses, quantos dias deverá aguardar antes que retorne a caravana e retorne a vida inteira.

Italo Calvino, As Cidades Invisíveis

domingo, novembro 19, 2006

Retiro Espiritual

Uma Árvore. Espelho vivo da condição humana. Ao germinar o céu aberto alimenta sonhos de eternidade. Crescemos. Crescemos em direcção a esse horizonte sem limites. Azul. Imenso. Depois a noite pinta-o de escuro. Um sorriso. Milhares de pontos cintilantes acendem-nos um sorriso. Para lá do espanto pálido da Lua ansiamos ainda poder tocar essas orbes. Ir mais além. Ramificações que se estendem para lá de nós. Infinito? Nesse momento o peso da terra torna-se insuportável. Poder voar. O peso da raiz debaixo da terra torna-se insuportável. Como se um apelo nos puxasse da pedra que nos sustenta.
Uma Casa. As pedras, as árvores, os sons que ecoam à passagem de um vento profundo, que sussurrando, nos conta o segredo dessas vozes de outrora, vozes que se faziam ouvir muito antes de nós. Aqui se encontra o retiro espiritual perfeito. Faz-nos despertar para os uivos primordiais de uma natureza que nos precede e ultrapassa, e que simultaneamente apenas vive no pequeno instante que cabe entre o precede e o ultrapassa, isto é, no momento em que nos trespassa. As pedras, o frio das pedras, as árvores, o cheiro das árvores, a casa, os sons, as cores, as linhas da casa, apenas respiram no momento em que as vemos. As folhas, os ramos, as gotas da chuva apenas dançam porque existimos. As linhas da casa ensinam uma verdade tão antiga como o tempo: Não há rupturas, apenas transfigurações.
E num instante tudo parece fazer sentido de novo, porque a eternidade não se encontra para lá das nuvens, mas do lado de cá. E é nestes pequenos momentos em que nos sentimos vitoriosos. Momentos em que sentimos que roubamos o fogo aos Deuses reclamando o espaço infinito para tamanho sentir.
Obrigado.